Primeira vez



            Era a sua primeira vez. Primeira vez que estava ali naquele lugar. Não tinha pressa, queria aproveitar cada momento, cada sensação, cada som que chegava aos seus ouvidos. Queria guardar na memória do seu corpo tudo o que aquele lugar poderia proporcionar. Sentou-se a beira da calçada e tirou os sapatos. Dobrou a calça até o joelho e caminhou. Seus passos eram lentos, algumas paradas pra respirar, caminhava com quem caminha para dentro de si: a imensidão de fora refletia a imensidão de dentro.
            Parou mais uma vez e agora começou a mexer os pés na areia. Aquela textura lhe intrigava, ora confortável, ora esfoliante. Grudava no meio de seus dedos e ainda assim a sensação era agradável, era como se partículas minúsculas em forma de mão lhe fizessem carinho nos pés. E como era boa essa sensação, de se sentir acarinhado. Há muito não sentia o toque dos afetos. Abençoados são aqueles que se deixam tocar pelo afeto da natureza.
            Conforme Maurício avançava o som do mar ficava mais intenso, até se tornar um conflito: areia ou mar? Qual escolher? Ali, parado no meio da praia, começou a observar os sons que o rodeavam: eram risadas, pés apressados, pássaros em seus rasantes, o vai e vem das ondas. Tudo era harmonicamente perfeito. Decidiu sentar-se na areia até resolver seu efêmero conflito: os carinhos da areia ou os encantos do mar?
            E foi quando deliberava dentro si seus conflitos que ouviu pés se aproximarem. O calor ficou mais intenso e o suor já não era resultado da alta temperatura. Era o típico suor do medo, do nervoso, do desconhecido. Quando menos esperou alguém sentou ao seu lado:
            - Olá ! Sou o Fred. Fred era morador da cidade litorânea, cresceu naquela praia e não saberia dizer quantas vezes mergulhou naquele mar. De corpo malhado e pele morena do sol, cabelos ao vento e um coração cheio de afeto. Fred percebeu o nervosismo de Maurício que nem ao menos conseguiu responder ao olá. Não era necessário: Fred já sabia que alguns silêncio são necessários e que as palavras tem tempo certo de chegar.
            Maurício continuou com seu conflito mas o calor e o suor o fizeram retirar sua roupa e permanecer nos trajes de praia. Fred atenciosamente acompanhou seus movimentos e enxergava em Maurício a insegurança de quem nunca havia passado por ali. Maurício continuou de pé, esfregando os pés na areia. Encantou-se com aquela sensação. Fred que cresceu na praia aprendeu a leitura da natureza e dos homens: a primeira é generosa e possuidora de uma força imensa, o segundo... Os homens podem ser impiedosos mesmo nos lugares mais lindos. Sem hesitar, Fred segurou nas mãos de Maurício:
            - Vamos? - E caminharam juntos rumo ao mar. Foram adentrando bem devagar, Maurício queria sentir realmente todas as sensações, uma por uma, sem exceção. Entraram até o mar atingir os joelhos. Maurício parou, sentiu as ondas, respirou fundo. Fred, cuidadosamente segurava as mãos de Maurício. Sentiam entre eles o encanto e o afeto que nenhum havia sentido. O que o corpo diz é sagrado mas são poucos os que conseguem compreender, há de ser uma certa ternura e um “quê” de sensibilidade. E ficaram os dois, ali, parados, sentindo as ondas, ouvindo os pássaros:
            - Fred? Faça-me um favor?
            - Sim, pode pedir.
            - Descreva-me o que vê com todos os detalhes, quem sabe assim, posso imaginar o que estou sentindo e ouvindo.

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